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Tarifaço de 50% para Brasil também é insustentável para os EUA, dizem especialistas
Especialistas destacam os impactos negativos da guerra tarifária para a economia americana, evidenciando a importância do Brasil em cadeias produtivas estratégicas dos EUA.
Vista no conjunto, a balança comercial entre Brasil e Estados Unidos mostra forte disparidade a favor do parceiro brasileiro. O mercado americano é o segundo maior comprador do Brasil, absorvendo 12% das exportações brasileiras. Em contrapartida, o Brasil representa apenas 1% das importações americanas, sendo o 18º fornecedor para os EUA.
Produtos estratégicos na pauta comercial
Apesar da baixa representatividade percentual, o 1% das importações americanas provenientes do Brasil inclui produtos de peso no consumo final e estratégicos para cadeias produtivas. Um tarifaço de 50% imposto por Donald Trump para todos os produtos importados do Brasil poderia inviabilizar esse fornecimento, causando custos e prejuízos também para os Estados Unidos.
No setor do agronegócio, o suco de laranja brasileiro representa entre 65% e 70% das importações dos EUA desse produto. O Brasil é o maior fornecedor individual de café, com participação que varia entre 20% e 30%, conforme as safras. Além disso, o país responde por 12% da oferta de açúcar de cana e 9% da carne bovina no mercado americano.
Impacto nas cadeias produtivas industriais
Na produção industrial, o Brasil ocupa posições estratégicas em cadeias concentradas. Responde por 37% das compras externas de celulose, um insumo básico para a fabricação de papel, embalagens e fraldas descartáveis. Fornece cerca de 20% do ferro-gusa, ferro e aço, essenciais para a produção de uma ampla gama de produtos como latinhas de bebida, veículos, navios e estruturas para construção civil. O país também está entre os cinco maiores fornecedores de aeronaves e peças, destacando-se a Embraer.
Verônica Cardoso, diretora de Economia do Direito na consultoria LCA, explica: "Somos produtores internacionais muito relevantes em mercados oligopolizados, com poucos fornecedores. É questão de vantagem absoluta mesmo, que pode criar impacto direto no consumo americano". Ela ressalta ainda que "não tem minério em todo lugar, não é todo mundo que faz celulose, Embraer faz produtos específicos não disponíveis em qualquer lugar e, no caso do aço, o grande concorrente direto no mercado internacional é a China, que também está em disputa com os Estados Unidos."
Dificuldades na substituição e consequências do tarifaço
Mesmo setores em que a substituição parece mais simples enfrentam desafios. Cardoso destaca que fatores como preço, logística e qualidade levam à escolha dos produtos brasileiros. "Não é fácil homologar fornecedores ou atender questões sanitárias, existe ainda logística e frete. Então, não se faz trocas do dia para noite, e feitas, será preciso assumir consequências em termos de custo de transação".
Além disso, a substituição demanda ajustes, mesmo quando há alternativas locais. Os EUA, por exemplo, são produtores e exportadores de petróleo, mas importam cerca de 5% do óleo brasileiro. Para substituir essas importações, seriam necessárias adaptações que certamente aumentariam os custos. "Se fosse simples, já teriam substituído o petróleo importado pelo doméstico", afirma Cardoso.
Perdas para ambos os lados
Embora as perdas possam ser maiores para o Brasil, os Estados Unidos também seriam prejudicados. Felipe Rainato, advogado e consultor na área de comércio internacional, comenta: "Possivelmente, os compradores norte-americanos consigam encontrar exportadores com preço mais interessante, mas, ainda assim, devem sentir um impacto".
Ele reforça que Donald Trump tenta transmitir a ideia de que a reindustrialização dos EUA depende do choque tarifário, uma política clássica de proteção de mercado, porém controversa e com efeitos conhecidos. "Seria até presunçoso da minha parte dizer que o consumidor americano vai pagar com o bolso dele, mas a tendência de qualquer política protecionista num mundo muito globalizado como o nosso é essa – o produto se torna mais caro, e o custo é invariavelmente absorvido pelo mercado interno."
Repercussões políticas e econômicas
José Alfredo Graça Lima, diplomata de carreira e experiente negociador brasileiro em assuntos econômicos, destaca que os produtos estratégicos brasileiros são trunfos importantes para o Brasil e seus parceiros no mercado americano. Ele lembra que empresas americanas insatisfeitas já fizeram Trump recuar em algumas tarifas, como as aplicadas a smartphones e eletrônicos, que foram retiradas para não prejudicar o setor de tecnologia.
"É certo que jogaram a bomba aqui no nosso quintal, gerando quase pânico no governo e em setores que temem perder um mercado tão importante, pois essa tarifa de 50% inviabiliza o comércio", afirma Graça Lima, vice-presidente do Conselho Curador do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais). "Mas não podemos esquecer que os importadores americanos devem estar muito chateados, até porque quem pagará essas tarifas serão eles."
Marta Castilhos, professora de Comércio Internacional da UFRJ, ressalta que as decisões tarifárias de Trump misturam temas diversos, como comércio internacional, a ameaça do BRICS, defesa das empresas de tecnologia e questões políticas. Segundo ela, "No fim, ele cria incertezas para a economia global e mina a confiança dos empresários, o que tende até a comprometer decisões de investimentos".
(FOLHAPRESS/ALEXA SALOMÃO)